Uma proposta de organização para o Centro Espírita centrada na evolução integral.
O centro espírita, considerado instituição celular do movimento espírita, para se estruturar regula-se por alguma referência extraída do pensamento espírita.
A título de exemplificação lembramos que a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, primeira entidade espírita criada por Allan Kardec, norteava-se pela definição do Espiritismo como ciência que estuda a origem, a natureza e o destino dos espíritos, bem como suas relações com o mundo corporal. Daí suas atividades terem sido organizadas buscando a produção do conhecimento, a investigação sobre o Mundo Espiritual e seus habitantes e a difusão da informação obtida.
Os centros espíritas no Brasil, em sua maioria, nos seus primórdios, se firmaram sob a égide de outro ensino espírita que afirma ser a caridade o caminho da salvação; expandiu a noção desta virtude, restrita a auxílio material e social em algumas conceituações, para questões relacionais, sugerindo a benevolência para com todos, indulgência para com as faltas alheias e perdão das ofensas. Incluiu este entendimento para o auxílio aos desencarnados em reuniões mediúnicas dominantemente centradas em superação de processos dolorosos obsessivos.
Foi esta escolha que fez prosperar uma imensa rede de cuidados a populações vulneráveis, com muita frequência realizando desde a doação de alimentos e cobertores até a criação de hospitais e educandários, em sua maioria, similares às atividades realizadas sob os auspícios governamentais. E, para alguns estudiosos de Sociologia da Religião, esta atividade foi, pelo menos em parte, o que assegurou a aceitação do Espiritismo em solo brasileiro.
Mais tarde surgiram iniciativas que se referenciaram principalmente na lição de Kardec de que para preservar a unidade do pensamento espírita era necessário manter cursos regulares de Espiritismo de modo a construir uma massa crítica de espíritas professos, como ele denominava os participantes esclarecidos, que assumissem institucionalmente os seus princípios.. Assim respaldados floresceram os cursos de Espiritismo de variadas abrangências culturais envolvendo progressivamente todas as faixas etárias sob a denominação de evangelização, juventude, estudos sistematizados, arte de envelhecer e grupos de pais, para ficar em alguns exemplos.
No bojo destes estudos havia referências à reforma íntima, ao modo de tornar-se um homem de bem através do conhecimento de si mesmo, a escalas evolutivas dos espíritos. Estes saberes, normalmente foram vistos como tarefas a serem vividas individualmente por se tratarem de questões de foro íntimo. No máximo poderiam ser partilhadas entre profitentes mais íntimos, usualmente, em crise existencial, como um socorro.
Assim o processo autoeducativo, de certa forma tangenciou a concepção e a organização do centro espírita. Mesmo estando informados pelo Espiritismo de que somos responsáveis pelo progresso ou processo evolutivo individual e coletivo e que tudo se encadeia em ascese na Natureza com base na manifestação do ser espiritual que somos, não percebemos a relevância de colocarmos a ideia diretora evolução espiritual como estruturante em nossas instituições. A ela dever-se-iam agregar todas as modalidades anteriores de pensamento e organização do centro espírita como derivadas da compreensão e processamento de um projeto evolutivo de pessoas e grupos.
Além disso ao tentarmos explicitar nosso objetivo de reviver o Evangelho em sua essência e originalidade na sociedade estamos distantes de nos pensarmos em atividades institucionais como os primeiros seguidores do Cristo que, convertidos, se organizaram em comunidade onde eram unidos pelo pensamento e pelo sentimento e agiam para lidar com as questões do mundo em vivência comunitária.
Para avançarmos segundo a lei da evolução que se fundamenta em parâmetros de mais complexidade, mais consciência, unidades coletivas em crescendo para definir progresso, podemos imaginar a instituição espírita centrada em grupos vivenciais comunitários. Assim o eixo institucional será deslocado para uma consciência ampliada da dinâmica da evolução, entendida, essencialmente, como expansão e aprofundamento da energética da amorosidade.
De uma perspectiva prática e contemporânea, podemos constituir núcleos de estudos vivenciais espíritas sabendo-os células da instituição. Estes núcleos se desenvolverão em atividades de autoeducação observando a multidimensionalidade da existência humana que abrange três grandes movimentos: o primeiro, autocentrado, cuidará do conhecimento de si mesmo na sua subjetividade, da vida interior, da cognição e cultura da dimensão mental, do mundo emocional, da volição e livre escolha, da percepção corporal e significado da vida física; o segundo, alocentrado lidará com as relações e suas influências na expansão amorosa da consciência, abrangendo a convivência conjugal, familiar, interpessoal, social, laboral, comunitária, lúdica, ecológica e interexistencial; e o terceiro movimento, holocentrado, cuidará da relação com o transcendente, do numinoso, da unidade cósmica, da superação da separatividade entre criação e Criador.
As atividades da instituição serão reguladas pela capacidade de oferta programada das células existentes como parte do seu processo evolutivo. Assim teremos uma organização viva, centrada nos seus integrantes, no seu nível evolutivo, num quefazer que interessa a cada um como parte de um ambiente de facilitação do seu exercício em progredir. Nela será possível preparar-se para o advento de uma comunidade em que seus membros se unem pelos laços de afinidade espiritual decorrentes da proximidade do estágio evolutivo movidos pelo interesse na ascese individual e coletiva.
Longe das uniformizações de práticas, aprendendo a refletir no conjunto o grau de elevação alcançado por cada um, o centro espírita se organizará liberto de regras exteriores e autoridades externas, ao tempo que se responsabilizará por suas decisões e consequências. Sua gestão será circulante entre líderes emergentes reconhecidos pelos participantes em momentos de elevação da consciência.
Seu fanal será alcançar a condição de espírito puro e co-criador cósmico e terá como auxiliar o saber evolucionista, permitindo-se uma vida mais próxima do ser essência afastando-se da superficialidade das aparências existenciais.
Viverá da partilha de experiências , da comunhão de ideais e ações práticas, da consciência apreciativa não julgadora referenciada em escalas evolutivas, da compreensão da diversidade de formas de agir e seu nível evolucionário, da busca do sentir-se ligado ao definitivo superando a impermanência, da síntese cultural do saber espiritual aplicado ao cotidiano.
A sua sustentabilidade em todas as suas dimensões virá dos seus participantes que definirão como podem colaborar ajustando as necessidades institucionais às capacidades existentes de modo a assegurar uma existência sem sobressaltos econômicos.
Uma administração formal, sempre leve e pequena, cuidará das relações com a realidade social materialista. Uma vivência harmônica anímico-mediúnica permitirá a identificação de participantes interexistenciais e sua forma de colaboração a depender de seu estágio evolutivo, sem atribuir-lhes primazia ou relevância por não estarem encarnados.
Tudo que já fazemos poderá ser aproveitado ressignificando sua finalidade que será focada naqueles que a realizam como parte do seu projeto evolucionário singular. Outras atividades poderão surgir em função do reconhecimento de demandas emergentes dos participantes.
Assim integraremos as funções sociais do centro espírita, templo, educandário, hospital, comunidade pelo eixo evolutivo que facilitará a compreensão dos objetivos e modos de atuar da instituição a serviço da evolução de todos os participantes. E em algum momento teremos o que apresentar para o mundo fecundando sua renovação social